Crise reduz venda ambulante no S. João

Victor Sousa revela que a Entidade Regional de Turismo Porto e Norte de Portugal e a Associação Comercial de Braga serão convidadas a integrar a Associação de Festas de S. João. A crise não passa ao lado da grande romaria bracarense: o presidente da associação constata uma redução significativa do número de vendedores ambulantes.


P - Este ano, a novidade das festas de S.João são mais dois dias que se acrescentam ao programa habitual.
R - Exacto. As festas normalmente terminam no dia 24 de Junho. Este ano o calendário é atípico porque o dia 23 é feriado de Corpo de Deus, o dia 24 é feriado municipal de S. João e logo de seguida temos um fim-de-semana para fecharmos as festas. Isto traz alguma alteração à tradição do espectáculo de fecho das últimas 16 edições, no estádio 1º de Maio, com fogo-de-artifício. Por esta questão de calendário, não vamos realizar esse espectáculo, decisão que se prende também com o período que vivemos. Optámos por um S. João diferente, mais económico

P - O facto de o programa se prolongar no tempo não leva a que os custos aumentem?
R - Prolongar o programa até ao dia 26 obriga-nos a ter mais alguns espectáculos, mas devemos ter em atenção que o tipo de espectáculos que o S. João leva ao encerramento das festas começou a ganhar relevo em termos de produção e de custos, o que nos obrigou a criar bilheteira. Este ano entendemos que, tirando o dia 23, não haveria espectáculos com bilheteira.

P - A Associação de Festas tem um orçamento inferior em 90 mil euros relativamente ao ano passado. Poderia ser mal interpretado assumir gastos com esse festival de encerramento?
R - É uma questão de credibilidade de quem organiza espectáculos desta natureza. Hoje, a Associação de Festas de S. João é uma estrutura que vai para além da carolice de um conjunto de pessoas que se esforçavam durante o ano inteiro para angariar receitas e donativos. Hoje, felizmente, temos uma estrutura com personalidade jurídica, com responsabilidade administrativa e fiscal, que tem de responder perante compromissos que assume no quadro da organização das festas. Presido à associação há 16 anos e chego sempre ao fim das festas com as contas equilibradas e sem dívidas. A estrutura financeira assenta no apoio de 40 mil euros da Câmara de Braga. São 40 mil euros desde que eu estou na Associação de Festas de S. João, porque entendo que esta existe para, de uma forma criativa, gerar receitas.

P - Que passam sobretudo pelo aluguer de espaços de venda ambulante...
R - Que são os patrocínios e os espaços de venda ambulante. Estes são um apoio indirecto do município.

P - A actual crise económica afectou essa componente da receita?
R - Essa é que é a grande questão que se levanta em relação à organização deste ano. Como é visível nesta altura, as avenidas Central e da Liberdade estão muito menos ocupadas. Até à data de hoje, estamos com uma diminuição de vendedores ambulantes na ordem dos 30 a 40 por cento em relação ao ano passado.

P - Não baixaram os preços?
R - Não baixámos porque há muitos anos que não subimos. O facto é que, conforme eu previa, é que houve um decréscimo grande num canal de receita importante para a estrutura financeira da Associação de Festas. Mesmo assim, continuamos a apresentar um programa muito vasto, acima de tudo um programa que me regozija bastante, porque não é um programa da Associação de Festas, mas um programa de Braga. Cada vez mais, temos um conjunto de associações e instituições que prestam homenagem ao S.João, que se aproveitam deste programa e deste espaço para mostrar aquilo que de importante fazem durante o ano.

Cartaz das festas promove sustentabilidade ambiental


P - Algumas pessoas estranham o girassol como motivo das decorações do S.João.
R - Este ano aproveitei a oportunidade do S. João para enaltecer e validar um dos aspectos que considero importante na vida em meio urbana: a sustentabilidade ambiental. O cartaz reflecte isso. Acho importante que as pessoas achem estranho. Essa é a forma de termos retorno da mensagem que queremos difundir. Braga é uma das cidades que tem tido preocupações ambientais. Fizemos apostas significativas que passam, muitas vezes, desapercebidas ao comum dos cidadãos. Designadamente na área dos transportes públicos com recurso a energias alternativas. Braga é uma das cidades integradas na rede de mobilidade eléctrica com 16 postos de abastecimento espalhados pela cidade. É uma cidade limpa com recolha de lixo diária e que tem feito um esforço significativo na estrutura relacionada com o meio ambiente. Estes são factores que entendemos que devem ser valorizados para sensibilizarmos os nossos concidadãos para a importância de todos contribuirmos para uma cidade sustentável.

P - Desculpe a provocação, mas então seria aconselhável substituir os martelos de plástico pelo alho porro na noite de S.João.
R - Aceito a provocação. Seria mais ecológico, mas deixávamos de ouvir as marteladas (risos).

P - Com as alterações na Avenida da Liberdade, os espaços de venda ambulante diminuiram. Vão ocupar novamente a Avenida da Liberdade com tendas?
R - Sim. Tenho visitado algumas festas populares que assumem um carácter importante sob o ponto de vista socio-económico nas cidades. Em Matosinhos foi-me dado observar a Avenida Brito Capela completamente repleta de vendedores ambulantes. Lá fizeram um esforço significativo de apresentação dos espaços. Nós fomos pioneiros nisso, mas queremos, no próximo ano, requalificar esses espaços, procurando que nunca se perca a tipicidade do arraial minhoto onde o vendedor ambulante faz parte. Fruto também das dificuldades económicas, hoje assistimos muito à venda de um pouco de tudo, a uma verdadeira feira. No decorrer destes anos já tentei ser mais criterioso na selecção dos vendedores, direccionando mais a venda ambulante para o artesanato. Posso dizer que tentei e não fui bem decidido porque verifiquei que, com essa selecção, não iria obter o nível de receita necessária. A realidade é um bocado esta. Eu entendo que a comparticipação financeira que a Câmara dá não representa, nem de longe nem de perto, o restante apoio municipal, quer a nível logístico ou da cedência da ocupação da via pública.

P - Em 2012 Braga vai ser Capital Europeia da Juventude. O S. João, apesar dos constrangimentos de ordem económica, vai-se adaptar a essa realidade?
R - O S. João é, fundamentalmente, uma festa que tem de preservar os valores mais tradicionais, o nosso folclore, a nossa gastronomia. Eu não quero, de forma nenhuma, que o S. João se modernize no sentido de desvirtuar a sua traça. O S. João tem de valer por todo o seu património imaterial, por aquilo que nós estejamos em condições de preservar. Há um esforço muito significativo de, por exemplo, manter a decoração da cidade. A cidade de Braga é única nas ornamentações das suas festas, que é muito sustentada no artesanato. As ornamentações são vivas durante o dia, não se ficam pela iluminação nocturna. É bonito olhar para a Avenida da Liberdade é ver os girassóis sobre os quais as pessoas se interrogam. Há um quadro do S. João que diz muito do que é a preocupação em preservar junto dos mais novos aquilo que é caro nas tradições do Minho: os bombos.Vamos ter este ano, não organizado directamente pela Associação de Festas, mas por uma associação parceira, a ‘Ida e Volta’, o XII Encontro de Gigantones e Cabeçudos. É o maior do país, se não o maior da Península Ibérica. Há um fenómeno neste Encontro que é a percussão. O Encontro já é mais um desfile de grupos de percussão do que propriamente de gigantones. Temos a participar neste desfile camadas jovens e as escolas.
Conseguimos perpetuar nas camadas mais jovens um dos fenómenos mais bonitos da nossa cultura de participação nas festas e de valores culturais que são nossos.

P - Quer dizer que não vai haver grandes alterações no programa das festas de S. João no Ano Europeu da Juventude?
R - Sob o ponto de vista da génese do S. João, não. Vamos manter a tradição. Sob o ponto de vista do programa, vamos procurar que ele seja eclético, com capacidade de atrair os públicos mais jo-vens. Este ano também fazemos uma aposta nesse sentido, no dia 23 de Junho, procurando promover bandas de garagem de Braga já com algum nome na praça. Será um espectáculo na Alameda do Estádio 1.º de Maio só para a malta mais jovem.

P - O que está a defender é que, ao contrário do que muitos possam pensar, manter a matriz do S. João assente nos valores etnográficos da região, consegue cativar as gerações mais novas?
R - Tem de ser um programa eclético para, sob o ponto de vista da vivência, captar os públicos mais jovens e, sob o ponto de vista do produto, ser formatado para vender como produto turístico. Que se constitua como alavanca neste período difícil para o sector do comércio tradicional.

P - Qual é o peso turístico do S. João?
R - Em termos de peso turístico do S. João - e vou falar em termos de dados de visitantes que temos no Posto de Turismo - será o segundo evento da cidade de Braga mais procurado, sendo o primeiro a Semana Santa. O S. João traz muita gente de concelhos vizinhos, que não passam no Posto de Turismo, e a Semana Santa é um fenómeno turístico com muito poder de atracção na Galiza. Sob o ponto de vista turístico, é importante que acha um conjunto de eventos nas cidades médias, bem calendarizados durante o ano e que sejam momentos fortes de atractividade e de promoção da própria cidade e concelho. Braga tem esse conjunto de eventos: S. João, Semana Santa, Mimarte, Braga à Mesa, Braga Romana.

P - O ano passado foi feita uma promoção do S. João em Santiago de Compostela e lançada a ideia de uma divulgação em várias cidades galegas. Isso acabou por não acontecer.
R - Tem acontecido. Na parte da promoção, gostaria de relevar o papel da Entidade Regional de Turismo Porto Norte de Portugal no quadro da sua competência. Este ano servimo-nos da loja da Entidade Regional em Santiago de Compostela para fazer a divulgação do nosso programa. Vamos fazer uma acção, proposta pela Entidade Regional, nas Portas do Sol, em Madrid, com a distribuição dos martelos de S. João. Braga, hoje, fruto dos sucessos no campo desportivo, está na Europa e no Mundo. Vamos também levar a efeito o ‘Movimento Vidal’, proposta também da Entidade Regional de Turismo, através do Facebook, no sentido de promover tudo o que está relacionado com as festas de S. João de Braga e do Porto.

Associação de Festas convida Turismo e Associação Comercial de Braga


P - A Associação de Festas de S.João continua queixosa da falta de cobertura dos grandes meios de comunicação, nomeadamente das televisões?
R - Relativamente às televisões privadas, compreendo que essas opções têm de ser observada em termos de retorno editorial. Já na RTP, televisão pública, tivemos oportunidade de assistir a um dia inteiro de emissão com casamentos e marchas de S. António de Lisboa. Eu reclamo para a minha cidade de Braga, enquanto autarca responsável pela área do Turismo e enquanto responsável pelas festas que na televisão que é paga por todos, os contribuintes bracarenses tenham oportunidade de ver a sua terra promovida. Essa é uma luta minha de há muitos anos, é uma luta de Braga, e eu penso que não podemos baixar os braços. Este ano já desenvolvi um conjunto de contactos a solicitar, como faço sempre, que o S. João de Braga seja também objecto de cobertura televisiva por um meio que é suportado por todos nós. Custa-me muito ver este tipo de discriminação porque não entendo que o contribuinte de Braga seja diferente dos outros.

P - A Associação de Festas mantém a posição de não dar em troca por essa cobertura televisiva?
R - Nós damos um programa.

P - Estou a falar de contrapartidas financeiras.
R - Não temos essa capacidade. Damos é um programa enriquecedor para uma programação televisiva, modéstia à parte.
O Encontro de Gigantones ou a cerimónia de abertura das festas deveriam ser momentos altos de cobertura televisiva que todos os portugueses e todos os minhotos que não estão no Minho gostariam de ver. A RTP tem grandes responsabilidades nesta matéria e Braga deve reclamar sempre a cobertura que lhe é devida neste domínio. Os meios locais são grandes parceiros e permitam-me destacar a segunda edição da festa da Rádio Antena Minho e jornal Correio do Minho.

P - A Associação de Festas de S. João não é um pouco ingénua não recorrendo ao ‘truque’ de chamar figuras públicas e mediáticas?
R - Admito que essa é uma forma de marketing adoptada por marcas e empresas. Nós estamos limitados em termos de orçamento e gostamos muito de sermos genuínos. Fico com muita pena que um meio de comunicação como a RTP, com a capacidade e o estatuto que tem, venha mais atrás de uma figura pública do que atrás de um programa que é o esforço de uma cidade.

P - Qual é a resposta do comércio, restauração e hotelaria às festas de S. João?
R - A resposta é boa. Há compreensão para com o movimento atípico da venda ambulante que representa alguma concorrência ao comércio tradicional.

P - Em tempos bastante recuados, a Associação Comercial de Braga chegou a organizar as festas da cidade. Entende desejável uma parceria mais efectiva dos comerciantes com a Associação de Festas?
R - A parceria institucional na gestão de um concelho deve sempre existir. Estamos abertos. A estrutura da Associação de Festas é constituída por pessoas que estão cá há muito tempo. A Associação tem de abrir-se. A Entidade Regional de Turismo é fundamental que esteja na Associação de Festas, tal como a Asso-ciação Comercial de Braga. Para o ano espero ter novidades em relação a essa questão.

P - Essas entidades vão ser convidadas a integrar a Associação de Festas?
R - Sim.

P - O presidente da Associação Comercial e Braga alertou recentemente para a situação complicada resultante da saída do Hospital do centro da cidade. Como vê o fenómeno?
R - Nós não podemos aferir o fenómeno de uma forma muito crua. Os números podem ser discutíveis. Entendo que o número de 10 mil pessoas que o Hospital de São Marcos movimentaria por dia é exagerado. A mudança do Hospital não deixa de constituir uma preocupação. Agora, esta observação tem de ser feita no quadro do risco da actividade económica.
O agente económico quando faz uma aposta em determinada localização sabe que tem factores de competitividade positiva e factores de competitividade negativa. Eu conheço alguns empresários que já procuraram deslocar a sua actividade para próximo do novo Hospital. Isso faz parte da vida e da estratégia das empresas. Eu penso que a actividade económica daquela zona que vai sofrer mais impacto é a restauração.

P - Embora a responsabilidade da reutilização do conjunto de edifícios do Hospital de São Marcos seja da Misericórdia de Braga, há preocupação por parte da Câmara?
R - Eu não estou habilitado para falar dessa matéria que é um dossiê que está nas mãos do presidente da Câmara. O que posso referir é que é um dossiê que nos é caro e em relação ao qual o presidente da Câmara tem uma grande preocupação. Há um canal de interacção muito grande entre o presidente da Câmara e o provedor da Misericórdia de Braga. Sei que os dois estão a trabalhar em conjunto para que se encontre uma solução com alguma celeridade.

18-06-11 - Correio do Minho

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